segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Há ou não conflito de gerações na música moçambicana?

Diz-se, que um especialista, falando para o seu auditório numa palestra, começou citando, as seguintes frases:
1.“Nossa juventude adora o luxo, é mal-educada, caçoa da autoridade e não tem o menor respeito pelos mais velhos. Nossos filhos hoje são verdadeiros tiranos. Eles não se levantam quando uma pessoa idosa entra, respondem a seus pais e são simplesmente maus.”
2.“Não tenho mais nenhuma esperança no futuro do nosso país se a juventude de hoje tomar o poder amanhã, porque essa juventude é insuportável, desenfreada, simplesmente horrível.”
3.“Nosso mundo atingiu seu ponto crítico. Os filhos não ouvem mais seus pais. O fim do mundo não pode estar muito longe.”
4.”Esta juventude está estragada até o fundo do coração. Os jovens são malfeitores e preguiçosos. Eles jamais serão como a juventude de antigamente. A juventude de hoje não será capaz de manter a nossa cultura.”
Imagine o amigo leitor, o sentimento de aprovação e consequente aceitação destes factos por parte da plateia, que o ovacionou e de pé durante largos minutos.
Na verdade, este, era o efeito que o especialista pretendia, pois, logo à seguir revelou, a origem de cada pensamento enunciado e dizia que:
O primeiro é de Sócrates que viveu a (470-399 a.C), o segundo de Hesíodo (720 a.C.), o terceiro de um Sacerdote do ano 2000 a.C e o último, achava-se inscrito num vaso de argila descoberto nas ruínas de Babilónia que continha mais de 4000 anos de existência.
O texto acima corre na Internet e auxiliei-me dele, para sustentar a minha posição, sobre o conflito de gerações entre os fazedores do pandza e Dzukuta e os da “velha guarda”
Não podemos ter o receio de afirmar que está instalado a crise e consequentemente o conflito de gerações entre os fazedores de música moçambicana, pois, os conflitos, sucedem quando as gerações diferentes, têm visões de mundo distintos e isto é natural, negá-lo, não passa de pura hipocrisia senão vejamos:
Do sentimento dos mais novos
Os mais novos actores da música, não se identificam com nenhum dos antigos. Na verdade, para além do medo que têm de ficarem como eles (todos pobres ou empobrecidos), sentem que a maioria destes são ingénuos e ultrapassados, porque, na sua maneira de ver, falta alguma garra neles e ou algum sentido de oportunidade.
Do sentimento dos mais velhos
Os mais velhos, acham que os jovens simbolizam tudo que é de errado na música, e acham estes, que não é pelo facto dos mesmos venderem, controlarem a mídia e as grandes empresas que faze deles grandes músicos, pois, para estes, o que a juventude faz e ajudado por estas empresas, é promover a promiscuidade, fazendo tudo, menos música.
Da questão da mudança
É bem verdade, que quanto mais a idade avança, mais difícil torna-se a mudança, porque os hábitos estão enraizados, seria todo descabido, obrigar em nome da mudança o José Mucavele por exemplo, hoje, a fazer Pandza ou Dzukuta, porque além de não aprovar o mesmo estilo, está habituado ao seu, aliás, era normal que os jovens o seguissem e não ele a estes.
Os jovens, por sua vez, têm uma grande capacidade e apetência de assimilar o novo rapidamente, e é aí, onde nasce o conceito de que os mais velhos são ultrapassados, pois, é como sustentava o outro no debate recentemente promovido, que “eu não tenho linha; na verdade, se me apetecer tocar Rock toco, se pandza, Dzukuta ou Marrabenta, não me importo. É só imaginar isto a ser dito por um José Mucavele, ou então imaginar, o que ele pensa de quem age assim.
Do que os músicos não devem ter medo de dizer
Não devem os mais velhos ter receio de dizer que não gostam do que os mais novos fazem. Não devem ter receio de dizer que admiram a parte do marketing por exemplo que é feito pelos jovens porque é forte. Que admiram a capacidade de alguns em investirem na qualidade dos vídeos, mas não alinham com a sua orientação musical, pois, dizer e defender o contrário não passe de hipocrisia.
Os jovens devem dizer e claramente, quais os seus medos, porque, fingir que gostam das músicas dos mais velhos enquanto não, é hipocrisia, mas também fingir não gostar, para meia volta fazerem versões que muitas vezes distorcem a música e causam arrepios ao ouvido, não passa também de grande hipocrisia.
Não se pode negar a diferença, porque parecendo que não, o reconhecimento desta, é primeiro passo, para agregar ideias e avançar em bom sentido.
Das intenções dos mais velhos
Os músicos mais velhos acreditam que com a sua experiência, com o acumular de idade, devem poupar os mais novos de experiências más que eles já experimentaram. Contudo, esquecem estes, que aprenderam fazendo e neste momento, certo ou errado os jovens estão a fazer.
Defendem estes que os jovens não os ouvem, contudo, penso que, mesmo que os jovens os ouvissem, nada lhes vais impedir de fazer questionamentos e tentar seguir por seus próprios caminhos, é a tendência natural da coisa, não a podemos evitar. há que intervir sim, mas sem sufocar.
Onde todos falham
Ninguém aqui dá tréguas ao outro. Há uma tendência exacerbada de cada actor, exaltar o seu ego e que se diga, não há lugar onde o ego mais se exalta que nos artistas. Os mais novos não cedem e pior os mais velhos; estamos na presença de extremos e quão difícil é lhe dar com os extremos.
Todos acreditam que podem viver sem precisar dos outros, e pior: que existe dentro da mesma classe, os primeiros entre os iguais. Na verdade, quem faz ou devia fazer a classificação de quem é bom ou mau músico não deveriam ser os próprios músicos.
Se não for a sociedade que com o seu ouvido vai seleccionando o que é bom ou mau, deve ser algum outro organismo e não de músico para músico, se bem que a opinião de um, é preponderante para o outro, daí a ideia da associação, pelo que não é de bom alvitre, um músico, aparecer em praça pública e munido de todas as zangas a classificar os outros, sem mais nem menos.
Penso que não compete ao Wazimbo como músico e/ou Zico, por exemplo, dizer em público quem ele considera ou não músico, ou quem imprime ou não maior qualidade nas suas músicas.
O que preocupa
Preocupa-me a questão de, em algumas cerimónias de cunho e carácter de Estado, se chame para cantar alguns produtos inacabados e precoces que pululam na nossa “indústria discográfica”, não faz muito sentido, que o Estado critique a temática das músicas de Zico e meia volta, use o mesmo como chamariz dos seus programas sociais. Não será esta, uma forma de legitimar o mal? Ou então; uma antítese a própria tese do que o Estado defende?
Não seria aqui, e porque o Estado não pode mandar nos gostos dos seus cidadãos que deveria educar para a adesão a “moçambicanidade”, chamando um Wazimbo ou Salimo Muhamad? Estará a cultura moçambicana expressa nas mini saias e cuecas dos rabos escuros, claros e clareados dos vídeos moçambicanos todos eles feitos juntos as piscinas, em iates, nas inacessíveis mansões da zona de Caracol e companhia?
Que as maiorias reneguem os músicos da velha guarda, aliás, em casos como este, não preocupa a maioria, porque existem por exemplo maiorias loucas, na verdade, nem tudo que é aceite pela maioria, é o politicamente correcto, é só lembrar que vezes houve em que a maioria decidiu fazer justiça pelas próprias mãos!
A mim, me preocupa, que em alguns eventos com carácter e cunho de Estado, se convide por exemplo um Robson, que de músico nada têm e o desafio a provar. Reparem, nada tenho contra este cidadão (que é um entertainer), se bem que gosto de muitos músicos brasileiros como Tim Maia, Ed Motta, Ney Matogrosso, o Djavan, Caetano Veloso e outros. Aceitaria que em eventos de Estado se chamasse um de calibre destes, porque seria como que puxar pelo músico moçambicano, de outra forma não passa da negação dos valores que o Estado diz defender.
Ou então envergonha ao próprio Estado o Filipe Nhatsavele que vai vestir a sapatilha do Moçambicano profundo contra os seus protegidos, que se orgulham em canal nacional, ante o cidadão que mal come e veste de vestirem Armanis, Guccis e companhia?
Infelizmente, não se pode impor que algumas empresas prefiram um músico no lugar do outro, porque seguidores do que o mercado consome e interessados somente em vender seus produtos, mas, o mesmo, já não faz sentido em algumas empresas intervencionadas por dinheiro público, como o Canal Oficial (TVM), que passe a vida a baldar os bons fazedores da música moçambicana. Se a TVM está preocupada com a concorrência, que implemente e já o seu canal comercial, onde poderá desfilar e num à vontade toda a promiscuidade.
Cito de memória um ministro brasileiro, que coincidentemente esteve em Moçambique, enquanto corria o espectáculo de um artista brasileiro e que, teria dito ou insinuado, que no lugar daqueles poderia se ter chamado outros e citou alguns.
Os que o Ministro citou, entendia, que são os que se identificam com o mosaico que é a cultura brasileira, são os que considerava reais Embaixadores da sua música, muitos, que têm as vozes castradas, pela fome da indústria de lucro. E porquê os ministros moçambicanos não fazem o mesmo? Acreditem, se fosse um alto dignatário, levaria comigo o Hortêncio, Cabaço; José, Mingas, Elsa, Isaú, Madala, Zena...
A mim preocupa-me quando os alguns músicos, negam o termo velha guarda, quando este significa um certo privilégio, pois, sinónimo de mais experimentado, mais antigo, veterano e me questiono haverá igualdade, senão em profissão entre o Dilon Njigi e Zico por exemplo? onde choca o termo velha guarda?
Também me preocupa, que alguns jovens, que assumiram a música numa visão empresarial (o que é de louvar), esvaziem o seu carácter de arte, em nome da mesma visão, e alguns dirão: mas se podem enriquecer, porquê não criar riqueza?.
Mas qual a solução?
Em todo mundo, a sociedade, é que inventa soluções para este conflito, porque mesmo não gostando por exemplo da geração pandza, nunca vou defender a sua extinção, vou evitá-la simplesmente e se um dia minha mulher, filha, e ou afim o preferirem vou respeitar, em nome da tolerância, aliás, da mesma forma que tolero vários Robsons por aí.
Na verdade, estes jovens, ajudam a entreter os nossos filhos e são de certa forma um contributo, para que os mesmos não se desviem e enveredem pelo ilícito.
Penso também que pode haver uma trégua entre os fazedores de um e outro estilo de música, o Tio Wazi e So What, deram nos algum exemplo, aliás, esta, é uma oportunidade soberana dos da velha guarda, de leve, introduzirem o seu conceito do que seja música aos mais novos.
Há pouco, assistimos a um casamento entre jovens e a velha guarda, que foi o projecto Mabulu, e o resultado foi o que todos assistimos: um boom de se tirar o chapéu, pela qualidade que imprimiu e pelo naipe de músicos que conseguiu aglutinar, mostrando que é possível este casamento e com qualidade.
Não me parece correcto que os mais velhos, não saibam interpretar os sinais da juventude, quando eles também já foram jovens e talvez, mais rebeldes e ousados que estes jovens de hoje, pelo que, quem se deve mostrar aberto ao diálogo, deviam ser os mais velhos.
Deviam os mais velhos aproveitar dos mais novos a visão empresarial que já demonstraram dominar e parar com a mania de não se quererem misturar, porque, mesmo na música com carácter de arte que eles fazem, precisam de algo que sustente esta mesma arte: o dinheiro. E para fazer dinheiro é necessário, um forte marketing e qualidade nos vídeos, os jovens já demostraram saber fazer e mesmo na música que estes fazem, é preciso, separar o trigo do joio, porque há outras com qualidade invejável.
Qualquer, que se sentir músico, deve ir a Associação e este, o receber de braços abertos, porque sua casa, deixando assim, os músicos, que sejam os organismos competentes, e a sociedade, a classificar o que seja ou não música.
Devem, tanto os mais velhos, como os mais novos, potenciarem-se, no sentido de acrescentar, onde se mostre que falta em cada um.
Ao músico a tarefa de fazer música e aos críticos de criticarem. Ficar a discutir se há ou não conflito entre a nova e velha geração e fingir não existir problemas quando existem é hipocrisia, porque especialistas de renome, acreditam que os “choques entre gerações sempre, vão existir, mesmo que mudem os motivos que os provoquem, uma vez que o que está por trás de qualquer conflito, é a luta pelo poder”, ou não?
Amosse Macamo

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