Kudakabanda, um disco que deve ser reeditado.
Admiro a autenticidade dos fazedores da boa música moçambicana. Cada executor tem a sua linha. É lógico, que esta se encontre algumas vezes com a linha de um outro, mas, mais distancia-se do que encontrar-se.
É só pegar, a linha de execução de José Guimarães por exemplo, é uma linha única e é isto, que faz dele o excelente executor que é, e o torna diferente dos demais, embora se possa encontrar algumas linhas comuns, com alguns artistas, exemplo da música “masseve”, que se confunde com a música “ho hanha kuti vonela” de José Barata.
Hortêncio Langa tem também a sua linha característica, uma fórmula única, uma forma musical difusa, marcada não só por estilos nacionais, como a fuga para o jazz e mais outros estilos internacionais. Costumo chamar o Hortêncio Langa, de poeta da vigília e de boas essências.
De vigília, porque sempre lúcido, sempre acordado para a intensa actividade que é a vida artística, aberto a novas tendências, sem contudo se desviar da sua linha.
De boas essências, porque, a sua música é perfumada por falas tão doces e leves cujo trato, lhe segue José Barata.
Sim, estes homens têm um verbo poderoso e leve, têm claro, formas de execução diversos, mas planos estéticos idênticos.
Eles cantam suas letras e melodias, como se estivessem a descarregar, constantemente a música de algum peso que a sufoque. Como se escolhessem as palavras que compõe as letras pela sua beleza e não pelo significado.
Hortêncio sabe lapidar suas canções, sabe analisar o social com um toque de classe, concretiza seus temas com uma execução rítmica própria de quem conhece a escala.
Semana passada, despertado pelo encontro do acaso que tive no Gil Vicente com ele, decidi rebuscar suas músicas.
Kudakabanda, foi a primeira música que ouvi e que se diga, a riqueza multiforme de melodias ali exploradas, levou a necessidade de ouvir o álbum todo e surpreendi-me:
Hortêncio fez no Kudakabanda, um álbum futurista.
Aquando do lançamento do álbum, e talvez influenciado pela fraca capacidade de análise, não encontrei, o peso estético que esperava encontrar do Langa, isto porque naquela altura, interessava-me apenas ouvir e não analisar e alisar. Não achei o álbum tão forte, como a personalidade do seu criador.
Mas o tempo, este nivelador, me provou o contrário; Kudakabanda é um álbum e tanto, é uma frescura de palavras ditas com maturação de um homem que aprende progressivamente, é uma mescla de sons marcados pela perfeição.
O desafio maior e certamente o mais estimulante no álbum situa-se nas letras do Hortêncio que constituem um infinito jogo de palavras que se espelham reciprocamente.
Rompe no seu cantar com o tradicional e com os seus próprios limites tradicionais e sob uma bandeira de poetização do seu discurso, vai construindo letras leves reveladoras de um certo nível de investigação literária, o que não é de estranhar, pois Hortêncio é também para além de músico, poeta confesso e com obra no mercado.
No entanto, não se trata de um discurso preocupado somente com os níveis estéticos, pois, há nas suas letras, outras verdades que devem ser descobertas, como quando diz na música Gha Tchotchovolo que ….swaku phuza niku gha tchotchovolo/kambe mundzuku ka siku loku ni pfukile/ni yinguela vanana vani kombela shinkwa/pawa. Shiriloooo (a mania de beber até cair quando no dia seguinte ao acordar ouve as crianças a pedirem pão e são prantos.
Quantos de nós nos revemos nesta música e se não, quantos amigos e familiares que conhecemos, que tem essa mania de esticarem o máximo, (bebendo até cair de costas) quando sabem que em casa falta até pão.
Outro factor é o arranjo desta música e honestamente, se tivéssemos no país, um top 10 das músicas mais bem produzidas, esta havia de constar.
Ou quando diz numa outra música que “…é preciso encher de mundos, esses olhos ocos/que flutuam perdidos na cegueira do pensamento (…)
É preciso espantar a morte/sacudir os vendavais/abortar a fome na terra grávida/terra grávida de 12 meses/ e mãe por mil vezes,”quanta poesia aqui existe? Quantas verdades ditas em duas palavras apenas?
Esta, é sim, a face poética do Langa a que fazia referência acima, poesia que se pode sentir e viver na música que dedica a cidade das acácias, onde diz entre outras palavras que “Maputo.cidade, como tu não há/com toda vaidade…/cidade surpresa/quem não te quer cantar/se tua beleza tem tudo para encantar (…), é a leveza das palavras a que me referia, que fazem do Langa, o poeta das boas essências.
Segunda-feira, aproveitei e dei um giro nas prateleiras das nossas discotecas e não achei sequer um disco de Hortencio, contudo, a admiração que causa este disco, sempre que é tocado, o menor número de tiragem que teve, a poesia e beleza das músicas, o arranjo fino que deveria inspirar as novas gerações, o som leve e sempre a desaguar no mar da verdadeira canção, leva-me a concluir que o Kudakabanda, deveria ser reeditado, talvez, aditando-lhe umas duas novas músicas, o que não sufocaria o disco, se levarmos em conta, que tem apenas 8 faixas.
Está agora lançado o desafio e espero que o Hortencio me responda e com uma resposta única: reeditar o Kudakabanda.
Então ó poeta da vigília e das boas essências: sai ou não o Kudakabanda?
Amosse Macamo
Admiro a autenticidade dos fazedores da boa música moçambicana. Cada executor tem a sua linha. É lógico, que esta se encontre algumas vezes com a linha de um outro, mas, mais distancia-se do que encontrar-se.
É só pegar, a linha de execução de José Guimarães por exemplo, é uma linha única e é isto, que faz dele o excelente executor que é, e o torna diferente dos demais, embora se possa encontrar algumas linhas comuns, com alguns artistas, exemplo da música “masseve”, que se confunde com a música “ho hanha kuti vonela” de José Barata.
Hortêncio Langa tem também a sua linha característica, uma fórmula única, uma forma musical difusa, marcada não só por estilos nacionais, como a fuga para o jazz e mais outros estilos internacionais. Costumo chamar o Hortêncio Langa, de poeta da vigília e de boas essências.
De vigília, porque sempre lúcido, sempre acordado para a intensa actividade que é a vida artística, aberto a novas tendências, sem contudo se desviar da sua linha.
De boas essências, porque, a sua música é perfumada por falas tão doces e leves cujo trato, lhe segue José Barata.
Sim, estes homens têm um verbo poderoso e leve, têm claro, formas de execução diversos, mas planos estéticos idênticos.
Eles cantam suas letras e melodias, como se estivessem a descarregar, constantemente a música de algum peso que a sufoque. Como se escolhessem as palavras que compõe as letras pela sua beleza e não pelo significado.
Hortêncio sabe lapidar suas canções, sabe analisar o social com um toque de classe, concretiza seus temas com uma execução rítmica própria de quem conhece a escala.
Semana passada, despertado pelo encontro do acaso que tive no Gil Vicente com ele, decidi rebuscar suas músicas.
Kudakabanda, foi a primeira música que ouvi e que se diga, a riqueza multiforme de melodias ali exploradas, levou a necessidade de ouvir o álbum todo e surpreendi-me:
Hortêncio fez no Kudakabanda, um álbum futurista.
Aquando do lançamento do álbum, e talvez influenciado pela fraca capacidade de análise, não encontrei, o peso estético que esperava encontrar do Langa, isto porque naquela altura, interessava-me apenas ouvir e não analisar e alisar. Não achei o álbum tão forte, como a personalidade do seu criador.
Mas o tempo, este nivelador, me provou o contrário; Kudakabanda é um álbum e tanto, é uma frescura de palavras ditas com maturação de um homem que aprende progressivamente, é uma mescla de sons marcados pela perfeição.
O desafio maior e certamente o mais estimulante no álbum situa-se nas letras do Hortêncio que constituem um infinito jogo de palavras que se espelham reciprocamente.
Rompe no seu cantar com o tradicional e com os seus próprios limites tradicionais e sob uma bandeira de poetização do seu discurso, vai construindo letras leves reveladoras de um certo nível de investigação literária, o que não é de estranhar, pois Hortêncio é também para além de músico, poeta confesso e com obra no mercado.
No entanto, não se trata de um discurso preocupado somente com os níveis estéticos, pois, há nas suas letras, outras verdades que devem ser descobertas, como quando diz na música Gha Tchotchovolo que ….swaku phuza niku gha tchotchovolo/kambe mundzuku ka siku loku ni pfukile/ni yinguela vanana vani kombela shinkwa/pawa. Shiriloooo (a mania de beber até cair quando no dia seguinte ao acordar ouve as crianças a pedirem pão e são prantos.
Quantos de nós nos revemos nesta música e se não, quantos amigos e familiares que conhecemos, que tem essa mania de esticarem o máximo, (bebendo até cair de costas) quando sabem que em casa falta até pão.
Outro factor é o arranjo desta música e honestamente, se tivéssemos no país, um top 10 das músicas mais bem produzidas, esta havia de constar.
Ou quando diz numa outra música que “…é preciso encher de mundos, esses olhos ocos/que flutuam perdidos na cegueira do pensamento (…)
É preciso espantar a morte/sacudir os vendavais/abortar a fome na terra grávida/terra grávida de 12 meses/ e mãe por mil vezes,”quanta poesia aqui existe? Quantas verdades ditas em duas palavras apenas?
Esta, é sim, a face poética do Langa a que fazia referência acima, poesia que se pode sentir e viver na música que dedica a cidade das acácias, onde diz entre outras palavras que “Maputo.cidade, como tu não há/com toda vaidade…/cidade surpresa/quem não te quer cantar/se tua beleza tem tudo para encantar (…), é a leveza das palavras a que me referia, que fazem do Langa, o poeta das boas essências.
Segunda-feira, aproveitei e dei um giro nas prateleiras das nossas discotecas e não achei sequer um disco de Hortencio, contudo, a admiração que causa este disco, sempre que é tocado, o menor número de tiragem que teve, a poesia e beleza das músicas, o arranjo fino que deveria inspirar as novas gerações, o som leve e sempre a desaguar no mar da verdadeira canção, leva-me a concluir que o Kudakabanda, deveria ser reeditado, talvez, aditando-lhe umas duas novas músicas, o que não sufocaria o disco, se levarmos em conta, que tem apenas 8 faixas.
Está agora lançado o desafio e espero que o Hortencio me responda e com uma resposta única: reeditar o Kudakabanda.
Então ó poeta da vigília e das boas essências: sai ou não o Kudakabanda?
Amosse Macamo