sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Que doença matou Joaquim Macuácua?

Sala Ema”
Lawa mavabyi aningue hanhi/
No vona(lorha) ntima wa sathani Ema
Ni dlawa hi mhaka ya wena nsati wa mina Ema
Vali aniku ringani (mussaveni) we nsati wa mina
Unga kwati murhandziwa
Vata ni landza lava vani dlayaka mina
Hlaissa vana va hina nkata haswo
Unga shenguiwe hi vama tiku vangaku peta lwandli Ema mama

Nili rhula murhandziwa
Nita vuya nitaku teka massiku ma taku
Ndzi rhula we nsati wa mina Ema
Ni tavuya ni taku teka massiku ma taku Ema

Unga rili murhandziwa
Niya lunguissa ndawu ya wena tilweni
Miela ku rila murhanziwa
Hitaku swi yini we nsati wa mina Ema

Miela Ema mamani aswa missava hi swoleswo nkata
Miela ku rila, miela ku rila...-Joaquim Macuácua

Que doença matou Joaquim Macuácua?
Sempre admirei os artistas, pela sua sensibilidade de dizer o comum de forma velada, pelo evasionismo, apelo ao belo, coração livre, pela intensidade e pela forma vibrante e típica que encaram a vida, dai, o meu ódio aos pseudo artistas justamente pela falta de arte na abordagem dos seus trabalhos.
Felizmente, o Joaquim Macuácua tinha um pouco de tudo, até com um pouco de exagero. Homem de discurso sólido, de beleza inigualável nos seus temas, polémico de natureza; sua música caracteriza-se na sua maioria, pelas suas próprias experiências de vida, muitas delas mal sucedidas, mas superadas em forma de canto.
Se o Joaquim fosse obrigado a escolher em seus próprios temas, um que caracterizasse a sua vida certamente que escolheria “Nicombela Ndlela”, justamente na parte que diz “kussuquela ni fika ka tiku leli (Maputo) utomi la mina lo honekela, lifamba hishi baba (…), /desde que cheguei a esta terra (Maputo), a minha vida só complicou-se, anda mesmo mal (…)
A música que me proponho abordar, não foge desta linha de drama paradoxal da sua própria existência; trata-se da música “Sala Ema”, que me parece ter sido cantado no limite do seu drama de vida.
Joaquim, é um exemplo de quem aceitou a morte e preparou as pessoas ao seu redor para a mesma, mas acima de tudo, como bom artista que era, disse a todo mundo e de viva voz, a doença que o matou.
Sim, Joaquim disse a todos nós, nesta música “Sala Ema”, que padecia de uma doença fatal e, como que num despertar existencial começa a música com o seguinte pronunciamento: “estou certo que com esta doença não vou sobreviver” e o questionamento: que doença o Joaquim tinha a certeza de que não haveria de sobreviver? Dito de outra forma; que doença havia de eliminar as suas esperanças de cura até ao ponto de declarar que tinha certeza de que não havia de sobreviver?
Lançada a afirmação, diz logo a seguir no segundo verso que “só consigo ver o luto de Satanás”. Mais um sinal de que não vai mesmo sobreviver.
Logo a seguir diz a mulher, que ela é a causa da sua morte, isto porque alguém o fez crer que ela não o merecia; em clara referência as mulheres com quem se relacionava (amantes.)
Esta atitude, é de puro arrependimento pois, se o Joaquim não tivesse ouvido essas vozes, teria permanecido fiel e consequentemente vivo até hoje e se morto, teria sido por alguma outra causa e não pela doença que o levou.
Se o amigo leitor pergunta-se até agora, o que o Joaquim está tentando dizer, e que doença estranha é essa que o vai tirar a vida, as dúvidas se dissipam, com o esclarecimento do verso a seguir, quando diz: “não se entristeça minha mulher, vão me seguir os que hoje me matam.”
Ora, se antes podíamos ter dúvidas quanto a doença que o Joaquim estava a tentar nos transmitir, depois desta afirmação fica tudo claro, pois, se ele tem a segurança de que os que o fazem morrer também o vão seguir, só se pode tratar de uma doença infecciosa que se transmite de pessoa para pessoa, logo, os que o transmitiram tambem vão o seguir porque esta doenca não tem cura. (sei que já estamos a caminhar juntos.)
Mas quando dizia no princípio que Joaquim preparou as pessoas que seriam afectadas directa e indirectamente pela sua morte, tal, ganha vida quando tenta acalmar a sua esposa Ema que chora, pedindo para que ela não chore “porque um dia, virei te buscar”.
Na verdade, quando o Joaquim nota que a Ema continua a chorar diz para ela, num acto de reconhecimento tardio de uma companheira de vida que “não chores meu amor, só adianto-me para preparar o teu lugar no céu.”
Uma declaração profunda, pois, reveladora da sua intenção de que os dois viverão juntos eternamente.
Estas declarações, são acompanhadas de um forte apelo, para que a mulher, fique a cuidar dos seus filhos, não deixando que ninguém interfira na sua vida, porque podem a “perder”e /ou desviar.
E Joaquim, quando se apercebe que não consegue animar a mulher, muda o ritmo (num acto que lhe é característico na maioria de suas músicas), de “slow” (sileta) para samba, como que exorcizando a morte com a dança e diz já aqui e todo feliz e certo de que venceu a morte; “não chore mulher, a vida é assim mesmo.” E não é assim?
Até hoje, não me perdoo por não ter entendido o SOS de Joaquim Macuácua, a tempo, porque se fosse atento e na altura diria que o Joaquim, foi o primeiro na sua classe, a quebrar o silêncio, dizendo de viva voz e para todos repetidamente sempre que a música era tocada, que padecia de uma doença grave e sem cura.
Com esta música não só disse a doença que tinha, como preparou a mulher para a sua partida, cantando a sua própria desgraça.
Ora, o facto de percebermos tardiamente uma declaração, não pode de forma alguma invalidar o que o declaratário quis dizer, pelo que, para todos os efeitos, o Joaquim Macuácua, foi o primeiro dentre os seus pares, a quebrar o silêncio e dizer de viva voz qual a doença que o apoquentava.
Mais uma razão, para me render a este intérprete e compositor de proa da música moçambicana.
Com esta música, Joaquim se renovou e venceu as suas próprias limitações como homem e como artista. Era um grande ARTISTA Joaquim Macuácua, um fascínio de ARTISTA…
P.S. se a pergunta de que doença matou o Joaquim Macuácua persistir no final destes escritos, não se preocupe, porque tal não é importante, o que faço ou tento fazer, é olhar nas entrelinhas…
Amosse Macamo