quinta-feira, 26 de novembro de 2009

MALANGATANA

Malangatana, o músico

Não sei o que este título poderá sugerir aos que conhecem a linha do Modaskavalu. Contudo, na urgência de encontrar respostas, um primeiro pensamento há de se colocar: o que tem Malangatana a ver com a música? (eu penso que tudo).

Há em Malangatana um músico meus amigos, um músico que se revela não só nas suas pinturas, nos esconjuros mágicos e poéticos das suas aguarelas, na verdade humana imprimida no seu pincel, mas também na sua essência, na sua revelação como homem.

Tenho muitas questionamentos por fazer ao Malangatana, questionamentos estes, que em parte encontraram resposta no filme Ngwenya, o Crocodilo. É que, confessou Malangatana neste filme, o seu amor pela música, aliás, numa disputa (disputam estes uma mulher) entre ele e um amigo seu (no mesmo filme), revela e de forma espontânea o seu lado cantor, cantando, e para a feliz mulher, se não me engano ka tiku dza zonga ni langui wene nwanhana (na terra dos rongas escolhi a si rapariga...), pena que no final, a mulher ficou (?) com os dois.

E questionarão alguns que instrumento Malangatana toca?

Para além do autêntico baixo-baritono (sua voz) que o Malangatana é, tem na sua barriga, (sim, barriga, esta, que quando a sua música o invade e de tal sorte que acredita viver na consciência das suas pinturas, na espiritualidade das suas cores e olhares, no ouvir os segredos do camaleão que teima em aparecer nas suas pinturas, toca-o qual batuque), o instrumento que toca o saboroso e lídimo batuque da sua terra Matalana.

Mas no mesmo filme, Malangatane trouxe a mística canção que diz acompanhar a sua vida:

Niwone niwone niwooooneeee

Niwooneee ahe ahe ahe ahe

Niwooonneee nkodjo

Niiiiwwoooonneeee, niwoooonnneee,

aie ahe aie ahe

niwone nkhodjo

Malangatana, diz ter ouvido esta canção na sua juventude no canto de uma Nyamussoro (lembrar que Malangatana foi aprendiz de nyamussoro, onde, nada acontece, sem o batuque e o canto), e que por alguma mística a mesma, o apaixonou de tal sorte que o acompanha até hoje; que sem se aperceber, a canta quando pinta.

Devo imaginar como Malangatana, recua no tempo quando a canta, devo imaginar as mil e uma explicações que tenta dar ao canto,mas ao mesmo, imagino que a mesma seja, talvez, o exprimir do objecto intencional que o trascende, a mesma antevisão que dita as suas cores, os olhares em seus desenhos, a ressureição da sua obra, as projecções de si mesmo, como homem que, esteja onde estiver, sente-se sempre no mesmo local: Matalane.

Esta canção é para Malangatana o poder de sentir de todas as maneiras, é o medidor do artista que ele é, mistério de si mesmo, equilibrador da relação triangular, pintura, homem, mundo.

É sim músico o Malangatana(atrevo-me a dizer dos mais internacionais do pais), não de hits, nem de músicas registadas em bobine, é sim, músico da nossa curiosidade psicológica, da nossa rica metafísica, da exploração da nossa espiritualidade,do nosso amadurecimento poético, dos aromas do dedilhar sentido nos dedos longos do Jaimito Machatine, dos versos geométricos de Alexandre Langa e Fany,da expressão vibratória do Modaskavalu do Mahecuane Makhuvele, do respirar a música na perversão sensual de Zeburane em Tsunela Seyo, nos cantos embebidos de mphongolo de Aurélio Kuwano, das cores endoidecidas e transitivas de Djambo 70, no emergir dos versos de ntumbuluko de Zeca Alage....

No final, sou obrigado a dizer; primeiro o músico e depois o pintor, é que, acredito que seja no canto que Malangatana se auto-direcciona para a pintura, na certeza de que a obra será concluida com o sucesso desejável.

Meu ode a este cantor não só de cores, mas também do nosso cancioneiro e do sonho utópico de o manter incólume para que a nova geração o estude e o eleja como o sabor da nossa espiritualidade.

Ode ao músico Malangatana.