quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Joaquim Macuacua e as mulheres bonitas

Joaquim Macuácua: o inconformado


Cresci a ouvir histórias fantásticas que me eram legadas pelos meus avôs, desde o Xitukulumukhumba, Guiguisseka, dos mineiros na terra do rand etc. Estas histórias, para além de povoar o meu imaginário obrigavam que no fim tirasse sempre uma ilação: o que tinha aprendido delas.

Eram estas histórias que nos emancipavam, que nos faziam transitar de criança, para adolescente e desta para adulto, isto porque, quanto melhor compreensão das mensagens por detrás; estava garantido a transição de uma fase para a outra.
Ora, se por um lado, estas histórias eram o termómetro que media a nossa capacidade de avaliar, por outro, mesmo que não nos pronunciássemos no final delas, por dentro, fervilhávamos com a nossa verdade inventada, com o subjectivismo que elas nos remetiam, o fantástico, a aventura, a inevitável fuga, o maravilhoso...era lindo.

Mas, o mais importante destas histórias é que com elas sempre se aprendia, mesmo que despercebido, porque era normal ouvir uma história aparentemente sem interesse, para no dia seguinte acontecer algo que nos remetesse a ela e em muitas situações era inevitável o arrependimento.

Mas é já na idade adulta, depois de cometidos todos os erros, que as histórias contadas na infância voltam em catadupas, obrigando-nos a confrontá-las, porque fugir, não mais adianta. É nesta idade, que dizemos a nós que se pudéssemos recuar o tempo, faríamos tudo como nos foi dito pelos mais velhos, porque experimentados, logo; conhecedores da verdade.

Hoje, proponho-me a abordar uma música que, embora carregada de deliberado extremismo que sempre caracterizou o seu autor, remete-nos, para este mundo que acima referenciei, falo da música “male yo luza” (dinheiro perdido), de Joaquim Macuácua.
Nos ditos dos mais velhos, é opinião assente que as mulheres bonitas têm sempre um defeito, como quem diz, “não há bela sem senão.”

O Joaquim Macuácua, antes de se casar com uma mulher bonita, certamente que desmentia esta teoria, contudo, o casamento e com uma mulher bonita o fez acreditar nesta teoria e não só, pareceu-me com esta música, que passou a ter grande pavor delas.

Mas entremos em análise, ainda que sucinta da letra:
Começa o Macuácua, dando a mão à palmatória no sentido de que se tivesse atendido a voz da razão (dos mais velhos), não teria caído num erro grosseiro em algo que lhe foi ensinado nos contos (A minkaringana va nga hi bulela va khale/impfa ihi nhika u sima…)

Como um escorpião que pica sempre no final, Macuácua, com esta introdução, evitava, que os mais velhos o dissessem, “nós avisamos”, daí que, tomando a dianteira já se auto condena.
Diz ele que os mais velhos o ensinaram a não brincar com dinheiro (a va khale va ni gwelile va ku unga tlangui hi male/a va khale va ni gwelile swaku sati waku sasseka wa loya) e mais, que mulher bonita é feiticeira.

Joaquim, deliberadamente, estabelece um paralelismo entre o valor do dinheiro e da mulher bonita, onde em última ratio, mostra que o seu dinheiro ganha.
Ganha, em o ter gasto a casar uma mulher bonita, pois, se soubesse que aquela seria a confirmação da tese dos mais velhos, a beleza não seria o atributo de escolha, daí que entre choros e lamúrias diz (ó male ya mina, juro ninga tlanga hi yona chissa!.), “oh meu dinheiro jogado fora.”

Seu dinheiro ganha tal valor que reduz a mulher bonita a uma mercadoria defeituosa, onde não lamenta a experiência mal sucedida de construir um lar, mas sim, o facto de ter jogado fora seu dinheiro, na convicção de casar uma mulher, afinal (nyia teka xiphunta mina), “fui levar uma louca”.

Na verdade, diz o Joaquim que vakokwane vani gwelile ku nsati wa ku sasseka wa loya/loku a nga loyi i gueleguele/loko anga guelezi i lolo/loko anga loloti wa yiva/loko anga yive wa mbwambua/loku anga mbwambwati ani futa he/loko angana futa ixidakwa xissa /ho mali ya mina, juro ninga tlanga hi yona leyi, o que traduzido diz; “os mais velhos me disseram que mulher bonita é feiticeira, se não é feiticeira é prostituta, senão for prostituta é preguiçosa, e se não é preguiçosa é ladra, se não é ladra tem desprezo e se não tem desprezo é porca, se não for porca decerto é bêbada; oh meu parco dinheiro jogado fora”.

Ora, face a este defeitos arrolados questionar-se-ia e é justo; o que sobra da virtude?

Esta mulher é tão péssima que até quando cozinha, tal comida, é intragável e quando o Joaquim a pede para comer, o indica a comida com o pé (loko asweka swakudla swo tlala a maha hikuni shungueta hi nengue).

Mas será esta a imagem de fundo que o Joaquim queria deixar? Era sua intenção reduzir a mulher bonita a nada? E será que o seu dinheiro vale mais que a tentativa de constituir família?

Penso que não. Na verdade Joaquim Macuácua, no estilo que lhe é característico, quis desmistificar a mulher bonita, para que não caia no convencimento de que pode tudo, só porque é bonita.

As mulheres que se acham bonitas sofrem de um complexo de superioridade tal que desprezam as que acham feias, na verdade, tem usado a beleza como único requisito para que sejam aceites socialmente (como se a beleza exterior fosse tudo), desprezam os seus companheiros, porque no seu dizer, “atrás de si, existem dez homens que querem estar comigo”, muitas destas desistem da escola porque alguém as convenceu que são bonitas, portanto, um sem número de situações que poderia relatar, que criam nestas, uma falsa representação da verdade e a pergunta: O que dizer de quem não vive a verdade?

E é lógico que não concordo com a tese dos mais velhos, mas, em algumas ocasiões, quando vejo mulheres que só colocam a questão da beleza como única forma de suprir as suas enormes faltas, tendo a inclinar-me.

Uma outra visão desta mesma música é a de que o Joaquim amou tanto uma mulher bonita e que deve no seu imaginário, tal como nos Minkaringanas, ter imprimido uma fuga no sentido de mulher ideal, que não encontrou na vida real e daí o inevitável desgosto.

De todas as formas, o Joaquim, com este exercício, espevita as mulheres bonitas e as despe das suas manias de grandeza, pondo-as no mesmo pé de igualdade com qualquer mulher, porque no fundo ele acredita que a verdadeira beleza de uma mulher é interior.
Amosse Macamo