SALIMO MOHAMED: “Tive um curandeiro que me tratou para ser invisível”
SALIMO Mohamed está a preparar um espectáculo para o dia 29 deste mês, no Centro Cultural Franco-Moçambicano, com uma banda que vai levar ao palco mais de dez elementos. O saxofonista Matchoti, o trompetista Leman Pinto e as irmãs Domingas e Belita, coristas. O “show” está a ser ensaiado com muito rigor, com Salimo na batuta, dirigindo um trabalho árduo, cujo objectivo é atingir a perfeição, ou os arredores dela, para oferecer ao público um trabalho de qualidade. É um espectáculo que já tem título, “Xingove Xi Dibi Mutxovelo” (o gato despejou o caril, traduzido do changana).Será uma página importante a escrever na vida deste monumento artista, um dos incontornáveis no nosso panorama cultural. Um forte pretexto para uma entrevista com Dzudza Muzimba, como também o chamam os seus amigos mais próximos.Mas fazer uma entrevista a Salimo será o mesmo que percorrer caminhos íngremes. Uma odisseia! Porque Salimo é uma odisseia ele próprio. Tem na sua vida histórias dramáticas. Que passam por aventuras doidas, com Suazilândia e Gazankulu (RSA) incluídas. Ou seja, no percurso de Salimo há muito sofrimento, incluindo prisões e campos de reeducação. Aliás, foi durante um dos cativeiros que Simião Mazuze adopta um novo nome e ficou a chamar-se Salimo Mohamed, o que poderá equivaler a dizer que Salimo queria nascer de novo. O autor de “Bilibiza” – música feita em homenagem a um desses campos de reeducação onde esteve – entretanto, olha para trás e diz que não tem quaisquer recalques. O importante é manter a força de espírito. O passado é passado. O importante é olhar para frente. Passar por cima de todos os pedregulhos. E viver!A entrevista decorre na sala de visitas da casa de Salimo, num ambiente de quando em vez perturbado pelo retinir do telefone e da conversa fraternal entre os dois filhos de Dzudza Muzimba. Dois filhos que constituem um grande amuleto para Salimo continuar a amar a vida. Eis, a seguir, alguns extractos dessa longa conversa com o autor de “Sambrowera”, “Paz” e tantos outros bons temas musicais:
Maputo, Quarta-Feira, 13 de Junho de 2007:: Notícias
- Comecemos por “Dawula Mananga”, gravado em 1985. É um disco que vem premiar uma aventura de muito sofrimento e castigo, que inclui prisão na Suazilândia. Chambocadas pela Polícia. Medo dos boers. Mas sobretudo uma tremenda vontade de ir para frente. Quer falar um pouco sobre esta história?- Foi em 1986, em Guiyane. Faço a minha primeira gravação na Gallo. O técnico de som era um inglês e eles ficaram bastante surpreendidos com o meu desempenho. O dono dos estúdios era um inglês que, olhando para mim e escutando o que eu tocava, disse assim: “venham cá ver este indivíduo que toca ritmos diferentes!”. Eles não esperavam. O Ray Phiri andava ali assim. Foram dizer-lhe “anda cá ver um gajo que parece um Marvin Gaye”, quando Ray Phiri há dias atrás nem me ligava. Ele agora reconhece-me e nos dias em que andou por aqui nos workshps do Kapa Dêch, disse àqueles jovens de que eu era um grande músico, que sofri muito...- Então “Dawula Mananga” será, concerteza, o resultado desta odisseia...- É verdade. É o resultado dessa loucura. Sofri muito. Não sabia muito bem onde ia. Cheguei a orientar-me pelo Sol. À noite andava à toa, sem nenhuma orientação. Mas algo me dizia que iria chagar ao meu destino. É por isso que fui.- Lembra-se, a caminho de Gazankulu, daquele boer que quase lhe esmagava os testículos com as botas e a arma?- (Risos). Eu tinha sido tratado por um curandeiro para ser invisível. Um curandeiro que provou depois que era muito bom. Ele disse-me que eu ia chegar ao meu destino. Numa das etapas da minha viagem à pé, de repente apercebo-me da aproximação de um carro da Polícia. Que para muito perto do local onde eu estava escondido. Do carro desceu um boer, que se aproximou do arbusto onde estava agachado. Ficou a menos de dois metros de mim, procurando vivalma ao longe e não me viu. Eu à rasca, mas o boer não me viu. Foi algo fenomenal. Ficou um tempo interminável para ver se me via mas, nada. Voltou a entrar no carro e foi-se embora. E notei que o curandeiro e os meus defuntos estavam comigo.
Eu sonho muito!
Maputo, Quarta-Feira, 13 de Junho de 2007:: Notícias
- Chegou, gravou o disco, ficou lá um tempo e depois voltou para Moçambique, onde está até hoje...- Voltei para casa. A minha casa é aqui. Onde vivo e trabalho.- Voltou porque ama a tua terra!- Amo muito! É aqui onde está o meu sangue. O meu ritmo. Toda a minha trepidação.- Ama a sua terra mesmo depois de tudo o que lhe aconteceu, como campos de reeducação e prisões?- Isso faz parte do meu passado. Já não poderá contar na perspectiva de vida que agora levo. O importante agora é o trabalho. Acredito que um dia as pessoas vão me compreender. Eu sonho muito. Estou permanentemente a sonhar, a reflectir e a trabalhar. Esse é o meu lema.- Não guarda algumas mágoas desse passado cheiro de feridas?- Não! Tudo já passou. As feridas secaram todas. Agora o que eu quero é viver e trabalhar e amar a vida.- Amar a vida e amar estes dois filhos menores que vivem consigo, dos quais é mãe e pai ao mesmo tempo...- ... é excitante ser pai e mãe ao mesmo tempo. Estou a cria-los desde pequenos. Lavei as fraldas deles. Cozinhei e ainda cozinho para eles. Houve tempo em que tinha que os levar todos os dias à creche e depois à escola e depois ir buscá-los. Mas agora estou mais relaxado. Eles já são grandinhos e estudam na Josina Machel. Já passou o tempo de sofrimento em que os tinha que levar à cama e depois à casa de banho para fazerem xixi. Fiz papel de mãe e faço-o até hoje. Nos tempos que correm dá-se muito valor à mulher, mas devia se dar ao homem também, porque eu consegui fazer aquilo que a mãe não fez, ou que devia ter feito. - Mas este facto de ser pai e mãe ao mesmo tempo, entristece-lhe ou dá-lhe orgulho?- Por um lado dá-me orgulho porque até aqui consegui aquilo que é o trabalho de uma mãe. Por outro lado entristece-me por saber que os meus filhos não tiveram aquele amor de mãe. Ela foi-se embora e deixou-me com eles. Isso me faz triste. Mas há uma recompensa. Eles sabem auto-gerir-se. Percebem que não têm a mãe, então vivem em função disso. Têm experiência. - Eles devem ser também felizes por comer a comida feita pelo paí. E diz-se por aí que cozinha muito bem...- Tu próprio és testemunha disso. Já comeste uma boa mathapa feita por mim. Preparo-te um bom caril de amendoim, bom guisado, etc. Não tenho problemas com a cozinha.- Salimo, explique-nos bem: vai tocar no dia 29 no “Franco”, num espectáculo chamado “Xingove Xi Dibi Mutxovelo”. Todos os seus espectáculos têm nome. De onde é que vem esta motivação de nomear os “shows”?- Eu estava para ir ao Lesotho para um festival anual que se realiza naquele país. Mas esse programa que tinha sido preparado pelo falecido Zibia (que Deus o tenha), não chegou a concretizar-se. Houve vários obstáculos apresentados pelo Ministério da Educação e Cultura e pela representação sul-africana em Maputo. Estava tudo preparado mas não fui. Também porque falei muito nos jornais. O rei Mushoswe manda perguntar se eu podia cantar para ele. Era primeira vez que eu ia cantar directamente para um chefe de Estado, para um rei. Acho que ele ouviu os meus trabalhos e gostou e perguntou por quanto tempo eu podia cantar para ele. Já estava tudo definido. Mas infelizmente não pude ir ao Lesotho e a partir daí comecei a dar nome aos meus espectáculos não sei porquê. Lembro-me que o primeiro nome foi “Nguva”, depois veio “Dzumba wa Nyanwaka”, “Dzudza Muzimba”, “Dji Polokotso”, “Dzumba hi ku Phinda”, “Kanga Hanya” e tantos outros. Agora tenho o “Xingove Xi Dibi Mutxovelo”.
Estou a trabalhar com jovens à altura da minha exigência
Maputo, Quarta-Feira, 13 de Junho de 2007:: Notícias
- Sei que está a trabalhar para este espectáculo com uma banda cheia de jovens e com dois monstros nos metais e duas beldades felinas. Como é que estão a comportar-se os jovens?- Os jovens com quem estou a trabalhar são uma beleza. Estão entusiasmados em trabalhar comigo. Eles sabem que sou bastante exigente e estão à altura das minhas exigências. Com eles está garantido um bom espectáculo. São jovens que não são muito conhecidos pelos nomes, apenas serão chamados filhos do Jordão do Chamanculo. E eles vão dar que falar.- Mas o Salimo tinha uma ligação quase umbilical com o Kwamula Band (Homa Mô). Haverá um divórcio?- Eu não estou desligado do Kwamula Band. A questão é que quando a gente injecta sangue novo, é sempre sangue novo e este sangue novo é bom realmente. Costumam dizer que eu não trabalho com jovens, mas estão aí jovens que estão a trabalhar comigo. São jovens talvez mais novos que outros jovens. Eles tocam, fazem arte. Não utilizam computadores, porque os jovens que se sentem lesados são aqueles que tocam no computador.- E estes jovens conseguem trabalhar com um homem exigente como você? Acha que eles estão bem consigo, partindo do facto de que é preciso ter fibra para trabalhar consigo?- Eles antes de aceitarem este desafio sabiam como é que eu quero ver as coisas. Eles estão a comportar-se perfeitamente bem. Estão num à vontade comigo.- Seria, hoje por hoje, capaz de mandar parar o espectáculo ao aperceberes-te de que há uma fuga, uma falha?- Não, agora sou outro boi. Tenho outra experiência, outra maturidade. Consigo contornar as falhas sem que o público se aperceba. Preparem-se para desmaiar de emoção. Sou um felino de Gaza. Chamo-me Salimo Mohamed O Dzudza Muzimba sou eu, se bem que já ouviste falar deste nome. Sou eu mesmo. De corpo e alma.
As letras aparecem quando estou a trabalhar
Maputo, Quarta-Feira, 13 de Junho de 2007:: Notícias
- Voltando ainda para trás, pois a sua vida também é construída desses tempos, chegou a ter um projecto de juntar quarenta elementos no palco duma só vez, os quais incluiriam timbileiros, para um rítmico de amálgama. Como é que esse sonho ficou?- Há coisas que não dependem apenas dos nossos sonhos. É preciso muito dinheiro. Mas eu tenho fé de que ainda vou a tempo de concretizar isso. - Nas suas letras sentimos um changana típico, com letras muito “pesadas”, profundas, metafóricas, parabólicas, um changana que não teria meias medidas para dizer seja o que for, nem que seja bojarda. Será que temos razão ou não temos?- Se for para mandar uma bojarda, mando para as pessoas que eu conheço, entre amigos. Numa discussão entre amigos também posso mandar. E aqueles que me conhecem também mandam uma bojarda contra mim. Sou humano e os humanos têm as suas falhas. E quanto as letras, elas aparecem quando estou a trabalhar, letras como “tlula, tlula madaka wo rhetemuka” (risos). Isso aparece em pleno trabalho, como se fosse um demónio que nos domina e fala através de nós. - E esse demónio é muito forte, revolto como o ponto de encontro de dois oceanos...- (Risos). Sabe, há um português, o José Cid, que me disse assim: óh Mazuze, não canta em português, canta na língua do teu povo e esse demónio que eu tenho não fala português. Fala changana muito pesado.- Mas eu conheço duas ou três músicas suas em que canta em português e parece perderem um pouco de sal...- Sim tenho “A Saudade Me Mata”, “Melo Yelo” e esta de “Paz”, mas eu fervo mais em changana, minha língua materna, que também é do meu pai.- É uma pessoa intensa. Com a cabeça sempre a ferver. A que horas é que dorme, normalmente?- Eu estou sempre acordado. Estou sempre a reflectir. Não paro. - E por falar em reflexão, agora lembro-me que fez uma música em homenagem à sua mãe, Maria. Podemos voltar para esse tempo?- Foi coincidência. Falo sim senhor da Maria, não como ela, a minha mãe, mas a mãe no geral. Os filhos a que me refiro são os combatentes que tinham saído daqui de Moçambique e que agora estão de volta. Refiro-me à mãe no geral e em especial à minha mãe porque eu em encontrava em Portugal, então no meu regresso cantei isso. - Não tem saudades do Simião Mazuze?-(Risos). Eu sou tudo isso, todos esses nomes. Estou todos os dias a festejar a vida, com sonhos e trabalho!...
SALIMO Mohamed está a preparar um espectáculo para o dia 29 deste mês, no Centro Cultural Franco-Moçambicano, com uma banda que vai levar ao palco mais de dez elementos. O saxofonista Matchoti, o trompetista Leman Pinto e as irmãs Domingas e Belita, coristas. O “show” está a ser ensaiado com muito rigor, com Salimo na batuta, dirigindo um trabalho árduo, cujo objectivo é atingir a perfeição, ou os arredores dela, para oferecer ao público um trabalho de qualidade. É um espectáculo que já tem título, “Xingove Xi Dibi Mutxovelo” (o gato despejou o caril, traduzido do changana).Será uma página importante a escrever na vida deste monumento artista, um dos incontornáveis no nosso panorama cultural. Um forte pretexto para uma entrevista com Dzudza Muzimba, como também o chamam os seus amigos mais próximos.Mas fazer uma entrevista a Salimo será o mesmo que percorrer caminhos íngremes. Uma odisseia! Porque Salimo é uma odisseia ele próprio. Tem na sua vida histórias dramáticas. Que passam por aventuras doidas, com Suazilândia e Gazankulu (RSA) incluídas. Ou seja, no percurso de Salimo há muito sofrimento, incluindo prisões e campos de reeducação. Aliás, foi durante um dos cativeiros que Simião Mazuze adopta um novo nome e ficou a chamar-se Salimo Mohamed, o que poderá equivaler a dizer que Salimo queria nascer de novo. O autor de “Bilibiza” – música feita em homenagem a um desses campos de reeducação onde esteve – entretanto, olha para trás e diz que não tem quaisquer recalques. O importante é manter a força de espírito. O passado é passado. O importante é olhar para frente. Passar por cima de todos os pedregulhos. E viver!A entrevista decorre na sala de visitas da casa de Salimo, num ambiente de quando em vez perturbado pelo retinir do telefone e da conversa fraternal entre os dois filhos de Dzudza Muzimba. Dois filhos que constituem um grande amuleto para Salimo continuar a amar a vida. Eis, a seguir, alguns extractos dessa longa conversa com o autor de “Sambrowera”, “Paz” e tantos outros bons temas musicais:
Maputo, Quarta-Feira, 13 de Junho de 2007:: Notícias
- Comecemos por “Dawula Mananga”, gravado em 1985. É um disco que vem premiar uma aventura de muito sofrimento e castigo, que inclui prisão na Suazilândia. Chambocadas pela Polícia. Medo dos boers. Mas sobretudo uma tremenda vontade de ir para frente. Quer falar um pouco sobre esta história?- Foi em 1986, em Guiyane. Faço a minha primeira gravação na Gallo. O técnico de som era um inglês e eles ficaram bastante surpreendidos com o meu desempenho. O dono dos estúdios era um inglês que, olhando para mim e escutando o que eu tocava, disse assim: “venham cá ver este indivíduo que toca ritmos diferentes!”. Eles não esperavam. O Ray Phiri andava ali assim. Foram dizer-lhe “anda cá ver um gajo que parece um Marvin Gaye”, quando Ray Phiri há dias atrás nem me ligava. Ele agora reconhece-me e nos dias em que andou por aqui nos workshps do Kapa Dêch, disse àqueles jovens de que eu era um grande músico, que sofri muito...- Então “Dawula Mananga” será, concerteza, o resultado desta odisseia...- É verdade. É o resultado dessa loucura. Sofri muito. Não sabia muito bem onde ia. Cheguei a orientar-me pelo Sol. À noite andava à toa, sem nenhuma orientação. Mas algo me dizia que iria chagar ao meu destino. É por isso que fui.- Lembra-se, a caminho de Gazankulu, daquele boer que quase lhe esmagava os testículos com as botas e a arma?- (Risos). Eu tinha sido tratado por um curandeiro para ser invisível. Um curandeiro que provou depois que era muito bom. Ele disse-me que eu ia chegar ao meu destino. Numa das etapas da minha viagem à pé, de repente apercebo-me da aproximação de um carro da Polícia. Que para muito perto do local onde eu estava escondido. Do carro desceu um boer, que se aproximou do arbusto onde estava agachado. Ficou a menos de dois metros de mim, procurando vivalma ao longe e não me viu. Eu à rasca, mas o boer não me viu. Foi algo fenomenal. Ficou um tempo interminável para ver se me via mas, nada. Voltou a entrar no carro e foi-se embora. E notei que o curandeiro e os meus defuntos estavam comigo.
Eu sonho muito!
Maputo, Quarta-Feira, 13 de Junho de 2007:: Notícias
- Chegou, gravou o disco, ficou lá um tempo e depois voltou para Moçambique, onde está até hoje...- Voltei para casa. A minha casa é aqui. Onde vivo e trabalho.- Voltou porque ama a tua terra!- Amo muito! É aqui onde está o meu sangue. O meu ritmo. Toda a minha trepidação.- Ama a sua terra mesmo depois de tudo o que lhe aconteceu, como campos de reeducação e prisões?- Isso faz parte do meu passado. Já não poderá contar na perspectiva de vida que agora levo. O importante agora é o trabalho. Acredito que um dia as pessoas vão me compreender. Eu sonho muito. Estou permanentemente a sonhar, a reflectir e a trabalhar. Esse é o meu lema.- Não guarda algumas mágoas desse passado cheiro de feridas?- Não! Tudo já passou. As feridas secaram todas. Agora o que eu quero é viver e trabalhar e amar a vida.- Amar a vida e amar estes dois filhos menores que vivem consigo, dos quais é mãe e pai ao mesmo tempo...- ... é excitante ser pai e mãe ao mesmo tempo. Estou a cria-los desde pequenos. Lavei as fraldas deles. Cozinhei e ainda cozinho para eles. Houve tempo em que tinha que os levar todos os dias à creche e depois à escola e depois ir buscá-los. Mas agora estou mais relaxado. Eles já são grandinhos e estudam na Josina Machel. Já passou o tempo de sofrimento em que os tinha que levar à cama e depois à casa de banho para fazerem xixi. Fiz papel de mãe e faço-o até hoje. Nos tempos que correm dá-se muito valor à mulher, mas devia se dar ao homem também, porque eu consegui fazer aquilo que a mãe não fez, ou que devia ter feito. - Mas este facto de ser pai e mãe ao mesmo tempo, entristece-lhe ou dá-lhe orgulho?- Por um lado dá-me orgulho porque até aqui consegui aquilo que é o trabalho de uma mãe. Por outro lado entristece-me por saber que os meus filhos não tiveram aquele amor de mãe. Ela foi-se embora e deixou-me com eles. Isso me faz triste. Mas há uma recompensa. Eles sabem auto-gerir-se. Percebem que não têm a mãe, então vivem em função disso. Têm experiência. - Eles devem ser também felizes por comer a comida feita pelo paí. E diz-se por aí que cozinha muito bem...- Tu próprio és testemunha disso. Já comeste uma boa mathapa feita por mim. Preparo-te um bom caril de amendoim, bom guisado, etc. Não tenho problemas com a cozinha.- Salimo, explique-nos bem: vai tocar no dia 29 no “Franco”, num espectáculo chamado “Xingove Xi Dibi Mutxovelo”. Todos os seus espectáculos têm nome. De onde é que vem esta motivação de nomear os “shows”?- Eu estava para ir ao Lesotho para um festival anual que se realiza naquele país. Mas esse programa que tinha sido preparado pelo falecido Zibia (que Deus o tenha), não chegou a concretizar-se. Houve vários obstáculos apresentados pelo Ministério da Educação e Cultura e pela representação sul-africana em Maputo. Estava tudo preparado mas não fui. Também porque falei muito nos jornais. O rei Mushoswe manda perguntar se eu podia cantar para ele. Era primeira vez que eu ia cantar directamente para um chefe de Estado, para um rei. Acho que ele ouviu os meus trabalhos e gostou e perguntou por quanto tempo eu podia cantar para ele. Já estava tudo definido. Mas infelizmente não pude ir ao Lesotho e a partir daí comecei a dar nome aos meus espectáculos não sei porquê. Lembro-me que o primeiro nome foi “Nguva”, depois veio “Dzumba wa Nyanwaka”, “Dzudza Muzimba”, “Dji Polokotso”, “Dzumba hi ku Phinda”, “Kanga Hanya” e tantos outros. Agora tenho o “Xingove Xi Dibi Mutxovelo”.
Estou a trabalhar com jovens à altura da minha exigência
Maputo, Quarta-Feira, 13 de Junho de 2007:: Notícias
- Sei que está a trabalhar para este espectáculo com uma banda cheia de jovens e com dois monstros nos metais e duas beldades felinas. Como é que estão a comportar-se os jovens?- Os jovens com quem estou a trabalhar são uma beleza. Estão entusiasmados em trabalhar comigo. Eles sabem que sou bastante exigente e estão à altura das minhas exigências. Com eles está garantido um bom espectáculo. São jovens que não são muito conhecidos pelos nomes, apenas serão chamados filhos do Jordão do Chamanculo. E eles vão dar que falar.- Mas o Salimo tinha uma ligação quase umbilical com o Kwamula Band (Homa Mô). Haverá um divórcio?- Eu não estou desligado do Kwamula Band. A questão é que quando a gente injecta sangue novo, é sempre sangue novo e este sangue novo é bom realmente. Costumam dizer que eu não trabalho com jovens, mas estão aí jovens que estão a trabalhar comigo. São jovens talvez mais novos que outros jovens. Eles tocam, fazem arte. Não utilizam computadores, porque os jovens que se sentem lesados são aqueles que tocam no computador.- E estes jovens conseguem trabalhar com um homem exigente como você? Acha que eles estão bem consigo, partindo do facto de que é preciso ter fibra para trabalhar consigo?- Eles antes de aceitarem este desafio sabiam como é que eu quero ver as coisas. Eles estão a comportar-se perfeitamente bem. Estão num à vontade comigo.- Seria, hoje por hoje, capaz de mandar parar o espectáculo ao aperceberes-te de que há uma fuga, uma falha?- Não, agora sou outro boi. Tenho outra experiência, outra maturidade. Consigo contornar as falhas sem que o público se aperceba. Preparem-se para desmaiar de emoção. Sou um felino de Gaza. Chamo-me Salimo Mohamed O Dzudza Muzimba sou eu, se bem que já ouviste falar deste nome. Sou eu mesmo. De corpo e alma.
As letras aparecem quando estou a trabalhar
Maputo, Quarta-Feira, 13 de Junho de 2007:: Notícias
- Voltando ainda para trás, pois a sua vida também é construída desses tempos, chegou a ter um projecto de juntar quarenta elementos no palco duma só vez, os quais incluiriam timbileiros, para um rítmico de amálgama. Como é que esse sonho ficou?- Há coisas que não dependem apenas dos nossos sonhos. É preciso muito dinheiro. Mas eu tenho fé de que ainda vou a tempo de concretizar isso. - Nas suas letras sentimos um changana típico, com letras muito “pesadas”, profundas, metafóricas, parabólicas, um changana que não teria meias medidas para dizer seja o que for, nem que seja bojarda. Será que temos razão ou não temos?- Se for para mandar uma bojarda, mando para as pessoas que eu conheço, entre amigos. Numa discussão entre amigos também posso mandar. E aqueles que me conhecem também mandam uma bojarda contra mim. Sou humano e os humanos têm as suas falhas. E quanto as letras, elas aparecem quando estou a trabalhar, letras como “tlula, tlula madaka wo rhetemuka” (risos). Isso aparece em pleno trabalho, como se fosse um demónio que nos domina e fala através de nós. - E esse demónio é muito forte, revolto como o ponto de encontro de dois oceanos...- (Risos). Sabe, há um português, o José Cid, que me disse assim: óh Mazuze, não canta em português, canta na língua do teu povo e esse demónio que eu tenho não fala português. Fala changana muito pesado.- Mas eu conheço duas ou três músicas suas em que canta em português e parece perderem um pouco de sal...- Sim tenho “A Saudade Me Mata”, “Melo Yelo” e esta de “Paz”, mas eu fervo mais em changana, minha língua materna, que também é do meu pai.- É uma pessoa intensa. Com a cabeça sempre a ferver. A que horas é que dorme, normalmente?- Eu estou sempre acordado. Estou sempre a reflectir. Não paro. - E por falar em reflexão, agora lembro-me que fez uma música em homenagem à sua mãe, Maria. Podemos voltar para esse tempo?- Foi coincidência. Falo sim senhor da Maria, não como ela, a minha mãe, mas a mãe no geral. Os filhos a que me refiro são os combatentes que tinham saído daqui de Moçambique e que agora estão de volta. Refiro-me à mãe no geral e em especial à minha mãe porque eu em encontrava em Portugal, então no meu regresso cantei isso. - Não tem saudades do Simião Mazuze?-(Risos). Eu sou tudo isso, todos esses nomes. Estou todos os dias a festejar a vida, com sonhos e trabalho!...
2 comentários:
Eix, tudo farei para ir a esse espectaculo!
Henduwé, nao poes titulos nas postagens porque pah?
he hehe apanhei-te fa de Salimo.este espectaculo ja se realizou a muito tempo...postei este entrevista porque acho que ela resume tudo de salimo,portanto, vamos esperando, que Salimo marque um outro show.
acerca do titulo: quando se fala de Salimo, nao ha titulo que caiba.....
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